Colaboradora da Unidade de Cosmiatria da Escola Paulista de Medicina esclarece pontos centrais sobre suplementação oral de colágeno
Para esclarecer dúvidas recorrentes a respeito da suplementação oral de colágeno e, desse modo, auxiliar os dermatologistas brasileiros a conseguirem melhores resultados no tratamento de seus pacientes, o Jornal da SBD convidou para um bate-papo aprofundado UMA referência no assunto: Lília Guadanhim, colaboradora da Unidade de Cosmiatria da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Na conversa, a especialista discorreu sobre: diferença entre os tipos de colágeno disponíveis; doses diárias recomendadas; associação da suplementação para tratamentos reumatológicos e para a pele; uso em pacientes com doenças preexistentes; suplementação combinada de colágeno com vitaminas; entre outros tópicos.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Jornal da SBD – Todos os colágenos são iguais ou existem diferenças em função do formato (cápsulas, pó e outros)? Existe uma opção mais indicada?
Lília Guadanhim – Quando o tema é colágeno, torna-se relevante sempre distinguir se estamos lidando com colágeno propriamente dito ou colágeno hidrolisado. O colágeno, em si, é uma molécula de alto peso, obtida a partir da gelatina. Em sua forma original, como colágeno não hidrolisado, ele tem 450 kilodaltons. Uma molécula com massa atômica que não consegue ser absorvida pelo organismo e, assim, não desempenha papel biológico. Costumo brincar: os pacientes que tomam colágeno não hidrolisado estão pagando caro para tomar gelatina. Para fins terapêuticos, é fundamental que primeiro ocorra o processo de hidrólise do colágeno, para sair dos 450 kilodaltons a um peso molecular que varia de três a seis kilodaltons. Nessa forma, sim, haverá peptídeos de colágeno, que conseguem ser bem absorvidos e desempenham papel biológico. Em relação à sua formulação, tanto faz se ele vem em forma de comprimido, balinha ou pó. A atenção deve estar voltada à dose. Os produtos que existem no mercado variam de 2,5g a 10g, o que é uma quantidade grande. É difícil conseguir colocar tudo isso em cápsula, por exemplo. Eu já ouvi depoimentos de pacientes que compraram colágeno fora do País e na embalagem a recomendação era tomar várias cápsulas ao dia, e eles não tomavam, por acharem excessivo. Isso é o que não pode. Tanto faz a forma de administração, desde que seja um produto com patente estudada e que o paciente respeite a prescrição indicada. É preciso saber qual é a característica de cada um dos produtos. Não necessariamente quanto mais, melhor.
Jornal da SBD – Uma dúvida frequente sobre o colágeno vem de pacientes que já usam o produto para tratamento das articulações. Se o paciente já utiliza esse tipo de colágeno, ele pode tomar também o colágeno para a pele?
LG – Sim. É possível fazer essa associação para pacientes que já usam o produto com foco no tratamento de articulações, ossos ou doenças reumatológicas. Essa associação não gera efeitos deletérios. É importante esclarecer que, quando o colágeno passa pelo processo de hidrólise, ele já pode gerar peptídeos com ação otimizada para pele, articulações e ossos. A partir daí, há formulações que direcionam efeitos mais específicos em algum dos tecidos. Só que não existe nada na literatura sobre benefícios de efeito cruzado. Mas, com base na minha experiência, acredito, sim, que os peptídeos usados com foco na saúde da pele também podem influenciar positivamente nas articulações, e vice-versa.
Jornal da SBD – Um grupo específico de pacientes cada vez maior é o de pessoas veganas. Existe algum colágeno que não seja de origem animal para atender esse público?
LG – Infelizmente, ainda não. O colágeno disponível no mercado é sempre obtido a partir de fonte animal. Vem da pele ou dos ossos de porcos, bois e peixes. No Brasil, há duas patentes principais e as origens são bovina e suína.
Jornal da SBD – A partir de qual idade a reposição é recomendada?
LG – Essa é uma das dúvidas mais frequentes. Eu ancoro a recomendação com base na literatura médica. Apesar de sabermos que o processo de envelhecimento começa de forma mais intensa em torno dos 25 anos, em geral, as pesquisas disponíveis sobre a suplementação oral de colágeno avaliam a faixa etária de 35 até 65 anos. Num estudo específico, há a análise de um subgrupo mostrando que, talvez, existam melhores resultados em pacientes acima dos 50 anos. Mas só um estudo aponta isso. Desse modo, de 35 a 65 anos, é o período com respaldo. De todo modo, não há contraindicação se quisermos começar a suplementação em pacientes mais velhos.
Jornal da SBD – E por quanto tempo se mantém a suplementação?
LG – O processo de envelhecimento é contínuo. Mas ressalto: segundo os estudos disponíveis na literatura, os acompanhamentos dessa suplementação são de oito a 12 semanas. Seguimentos mais longos acompanham os pacientes por até seis meses. Por isso, minha indicação é em torno de ao menos 12 semanas, para conseguir avaliar a terapêutica. Se a resposta for satisfatória, mantemos por mais tempo.
Jornal da SBD – Existe algum risco para saúde? E restrição por interação medicamentosa?
LG – Esse é um cuidado relevante. O colágeno é considerado um suplemento alimentar sem contraindicação. Ele é seguro, uma vez que não contém gorduras, carboidratos, colesterol e possui baixo risco alergênico. Inclusive, o Food and Drug Administration (FDA, nos Estados Unidos) classifica o colágeno como um produto Generally Recognized as Safe (GRAS). Eles partem do princípio que a suplementação é segura. Não há problema fazer em pacientes com doenças reumatológicas, doenças renais, nada disso.
Jornal da SBD – A vitamina C ajuda na absorção? Há uma oferta considerável no mercado de produtos que associam o colágeno a outras vitaminas. Qual a recomendação?
LG – Precisamos observar esse ponto com atenção. Existe muito boato na internet e no boca a boca. A resposta científica é que a vitamina C é um fator importante para a síntese de colágenos, no entanto, a enorme maioria dos estudos só avalia a suplementação isolada de colágeno. Há pouquíssimas pesquisas que analisam essa suplementação combinada com outras vitaminas. Logo, não há na literatura essa recomendação. Além disso, sempre há o risco de hipervitaminose. Se fizer a reposição por um tempo maior, tem que estar atento a isso. Também precisamos lembrar que a suplementação de determinadas vitaminas em pacientes com predisposição a algumas doenças pode aumentar o risco de deflagração. Isso é válido para doenças cardiovasculares, alguns tumores. Por isso, é fundamental estar sendo acompanhado por um médico e avaliar a dose e o tempo.
Jornal da SBD – Em relação ao horário de uso do colágeno? Deve ser tomado em jejum?
LG – Quanto a esse ponto, não há recomendação técnica. Ele pode ser tomado depois do almoço, em jejum, tanto faz.
Jornal da SBD – Os pacientes que já fazem uso de outros procedimentos que estimulam a produção de colágeno têm melhores resultados se associam à sua terapêutica a suplementação oral?
LG – Racionalmente, faz todo sentido realizar um procedimento para estimular a produção de colágeno e associar a isso a suplementação oral. Há um estudo feito na Coréia, que avaliou esse resultado em oito pacientes submetidos ao laser fracionado não ablativo. Nessa pesquisa, o autor explica, inclusive, que no pós-procedimento de laser não ablativo os pacientes têm muita queixa de ressecamento e eritema. Logo, ele resolveu avaliar essa diferença entre quatro pacientes que receberam a suplementação, e outros quatro que não receberam. Ele introduziu a suplementação com peptídeos de colágeno duas semanas antes de realizar o procedimento e continuou duas semanas após. Apesar desse ter sido um estudo bem pequeno, a conclusão do autor é que a satisfação dos pacientes que receberam a suplementação foi bem maior e houve menores efeitos de ressecamento e eritema. Logo, essa associação faz sentido, mas ainda há poucos casos descritos. É um tema aberto.
Jornal da SBD – Como é realizada triagem de pacientes para iniciar a suplementação? Qual a expectativa do tratamento?
LG – A expectativa é algo fundamental a se alinhar com o paciente, antes de iniciar o processo. Há pacientes que se queixam de flacidez e celulites intensas no rosto. Nesses casos, a suplementação com colágeno hidrolisado não vai resolver o problema. Por isso, eu gosto de demonstrar pontualmente o que existe reportado em termos de evidências para cada patente disponível no mercado. A partir daí, chegamos a uma conclusão em conjunto. Os registros indicam melhora em cerca de 28% da hidratação e 9% da densidade do colágeno dérmico, além de redução de 30% na fragmentação desse colágeno. Também há publicações indicando aumento da elasticidade, em média 7; diminuição do volume de rugas na região periocular; e em um estudo específico, com viés de condução, mas que faz biópsia por sucção da região periocular, mostra 65% de aumento do pró-colágeno tipo 1 e aumento de 18% da elastina. Esses são os benefícios que podemos esperar, pensando em envelhecimento. Há ainda um estudo sobre celulite, que costumo citar, porque mostra redução de 11% do relevo da pele. Entre melhorar 11% e olhar no espelho e enxergar isso de forma objetiva existe uma lacuna. Por isso, realmente é preciso alinhar muito bem com o paciente as expectativas. Se ele estiver de acordo com as evidências descritas do benefício, a suplementação surge, então. como opção.