Dicas para quem vai terminar em breve a residência/especialização e começar a carreira como dermatologista




10 de dezembro de 2019 0

JSBD – Ano 23 – N.05

Prof. Silvio Marques
Editor dos Anais Brasileiros de Dermatologia

 

1- Um dos problemas capitais ao terminar a residência é vir a ficar distante da rica rotina de casos e da supervisão dos preceptores. O risco, comum, é passar a vivenciar casos repetitivos, pouco desafiadores e ir perdendo paulatinamente o repertório de diagnósticos e o raciocínio clínico mais especializado. Há que lutar contra isso. Como? Sempre que possível ficar vinculado a um Serviço. O de origem ou o que for viável. Vincular-se como voluntário, colaborador ou membro do estafe seria o ideal. Caso não seja possível, ao menos frequentar as reuniões clínicas do Serviço. Ser assíduo às jornadas clínicas, nos Congressos assistir às sessões de casos clínicos, ficar atento aos pôsteres. Participar de grupos de discussão, compartilhar casos. Para atualização teórica, podemos estudar e buscar artigos a qualquer hora, mas rever casos clínicos, se sentir desafiado, é outra demanda e que pode auxiliar a identificar áreas ou subáreas em que é preciso se aprimorar. Importante ficar atento ao vai e vem epidemiológico das enfermidades. Por exemplo: estamos em meio à epidemia de sarampo, mão-pé-boca, incluindo adultos, com o surgimento de efeitos adversos às terapêuticas-alvo; pois bem, como se expressam clinicamente? O que devo procurar saber? Esse tipo de atenção e exercício intelectual deve ser permanente. A manutenção das habilidades e seu upgrade também devem ser preocupações constantes.

2- Quando me refiro a “habilidades”, quero ir além dos procedimentos, pequenos ou grandes. Penso também em outras habilidades fundamentais, nem sempre adequadamente treinadas ou aperfeiçoadas na residência, tais como: empatia, acolhimento, gentileza, educação, e nos cuidados essenciais ao atender alguém do sexo oposto e até mesmo do mesmo sexo (ou gênero). Cada um dos substantivos acima tem seu significado intrínseco, suas semelhanças e completa os demais. Cada um de nós tem seu jeito de ser: mais ou menos formal, mais ou menos informal, mais ou menos alegre… O importante é que o dito acima seja praticado sempre, independentemente de qualquer circunstância: SUS ou consultório, rico ou pobre, do partido X ou Y, enfim… Princípios valem sempre. E, mais, não raro construímos a história clínica, perguntamos isto e aquilo, estamos digitando, e o olho no olho se perde… e a conexão médico/paciente se esgarça. Treinar como quebrar o “gelo” da primeira consulta, escolher perguntas triviais, mas que funcionam, chamar sempre pelo nome, em que bairro mora? Como estava o trânsito? Muito óbvio….? Sim, mas nem todos têm o tom e a maneira autêntica de perguntar e se relacionar… O que é facilmente perceptível… Portanto, atenção e treino.    

3- E quando não sabemos o diagnóstico? O resultado terapêutico esperado não vem? O laudo histopatológico é descritivo, e você não consegue interpretá-lo ou a margem profunda veio comprometida, ou é mesmo um melanoma. Como nos comportar? São hipóteses distintas e com respostas e encaminhamentos distintos, mas é comum a maneira de os enfrentar. Como? Usando de plena franqueza e sinceridade! Os pacientes leem as nossas reações, nossa linguagem corporal e nosso silêncio. Há uma semana, paciente que havia excisado melanoma extensivo superficial no antebraço, Breslow 5mm, com linfonodo axilar aparecendo um ano após a exerese, vem para checar PAFF do linfonodo axilar. Abro o sistema de laudos, fico em silêncio por uns minutos. Quando volto meu olhar para ele, vejo as lágrimas rolando… Por algo que transmiti, ele intuiu que fora positivo para metástase. O que fazer? Levanto, dou volta à cadeira do paciente, pouso minha mão no seu ombro, acaricio, chora a esposa, chora a filha, quase embarco também, permanecemos em silêncio, ofereço o lenço e após uns minutos, retomo: “Senhor, todos nós sentimos muito, mas temos que ser firmes, e a etapa seguinte agora é…” Ou seja, temos que ter alternativas a oferecer, temos que ter a quem consultar, perguntar, mostrar, discutir, encaminhar, com o panorama o mais aberto possível.

 

 


18 de junho de 2019 0

JSBD – Ano 23 – N.02 – MARÇO-ABRIL

 

Catarinense de Balneário Camboriú, o jovem Gerson Dellatorre já pensava na medicina ainda na fase escolar. Filho de cardiologista, a predileção pelas matérias biologia e química já davam indícios do caminho que seguiria. Hoje, com 34 anos, enveredou pelo campo da produção científica, após concluir residência médica em dermatologia no Hospital Santa Casa de Curitiba, onde é preceptor há mais de cinco anos. Suas descobertas, até agora, que ele classifica como feitas por acaso, na verdade causaram bastante empolgação no meio acadêmico. Não à toa três artigos seus foram aceitos no JAAD e um no British Journal.

Com publicações em várias áreas de dermatologia, Gerson ultimamente tem veiculado casos inéditos na temática do transplante de melanócitos, como o primeiro caso da aplicação da técnica em paciente com lúpus eritematoso cutâneo subagudo (Journal of Cosmetical Dermatology) e também em paciente transplantado de órgão sólido com vitiligo (Anais Brasileiros de Dermatologia).

“Meu interesse dentro da dermatologia é amplo, mas, em especial, em cirurgia dermatológica (câncer da pele, transplante de melanócitos, vitiligo etc.).  Gosto muito de pérolas, sejam clínicas ou cirúrgicas; são de fácil reprodução e provocam grande impacto prático na vida do leitor, pois mudam sua rotina na prática”, comenta Delatorre. Quatro de suas publicações recentes, aliás, foram nesse formato: “Reliable head bandage”; “Syringe pen: an alternative skin-marking tool in dermatologic surgery”; “Wide area digital dermoscopy” e “Stamped adhesive ruler”, todas no Blue Journal.

Gerson começou a publicar ainda na graduação, mas por acaso. Quando acadêmico, sofreu um acidente por um tipo específico de água-viva, a Linuche unguiculata. Ao consultar seu professor e incentivador na dermatologia André Luiz Rossetto, este o informou que estava registrando casos para um estudo clínico-epidemiológico. “No final das contas, acabei entrando para a casuística do estudo e fui convidado para ser co-autor desse artigo, que foi publicado na Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (“Seabather's eruption: a clinical and epidemiological study of 38 cases in Santa Catarina State, Brazil”)”, comenta. Mais tarde, já na época da residência, um conselho fundamental foi dado pelo amigo Caio Castro: a importância do ineditismo antes de pensar em fazer qualquer estudo.

Para seus papers, além do ineditismo já citado, a inspiração parte da vontade incessante de responder a dúvidas e tentar arranjar soluções para problemas da prática dermatológica. “Já tive ideias até dormindo. Acho que uns dos pontos que favorecem esse surgimento é a curiosidade interminável. Isso acaba fazendo com que sempre estejamos com a cabeça em funcionamento. Acredito muito também em serendipidade (descobertas feitas por acaso). Duas de nossas últimas publicações internacionais sobre uma nova técnica de dermatoscopia vieram de uma ideia que tive enquanto estava buscando uma solução para uma questão de edição de imagens num software de computador. E dali saiu o conceito de dermatoscopia digital de campo amplo (wide area digital dermoscopy)”, explica. E esse modus operandi tem dado certo. Prova disso é que, nos últimos 12 meses, foram publicados sete trabalhos, sendo quatro deles em seis meses. “Não considero um número expressivo, mas no Brasil, infelizmente, acabamos publicando por paixão e não por profissão. Ou seja, para nos debruçar sobre um paper, temos que acabar sacrificando tempo da vida pessoal ou de consultório para conseguir produzir artigos de qualidade”, complementa.

Para o futuro, mestrado e doutorado estão em seus planos. Mas com um porém: que o tema central seja empolgante e traga impacto para a sociedade científica. “Estou aguardando surgir uma boa ideia”, pontua. Ninguém duvida de que ela logo aparecerá.





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