A elaboração das novas regras para a propaganda/publicidade médica foi uma construção coletiva que levou ao menos três anos de debates
e mais de 3 mil consultas de esclarecimentos para se concretizar. A Resolução CFM nº 1.974/2011 foi considerada um marco por trazer a objetividade para a divulgação de assuntos médicos, uniformizando o entendimento do que seria aplicado para seu controle. Mas ainda havia subjetividade, e a interpretação pessoal continuou a existir. Havia um entendimento de que a regulamentação persistia restritiva, com poucos consentimentos.
O fortalecimento das redes sociais e a facilidade para produzir imagens, áudios e textos, que antes requeriam uma equipe de produção e
filmagens, com aparelhagem pesada, deu lugar a produções ágeis com aparelhos celulares, hoje um multifuncional para os mais diversos fins.
A partir dessa constatação, passamos a vislumbrar a necessidade de ajustes, os quais foram realizados por meio da Resolução CFM nº
2.126/2015, que estabeleceu limites no uso das redes sociais. As discussões continuaram acirradas, devido à rigidez na apresentação de temas que não ofendiam a ética médica ou por causa da existência de conflitos entre a medicina como atividade-meio, que não garante resultados, e a violação a esse princípio, com garantias de resultados, tornando a medicina uma atividade-fim.
Depois de realizar debates nos CRMs de Tocantins, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Santa Catarina, dos quais participaram médicos, publicitários, jornalistas, advogados, administradores e contabilistas, o CFM entendeu que a medicina deveria ter uma relação honesta com o mercado. Foi dado um enfoque realístico ao tema, afinal, existe uma parte da publicidade que deve ser voltada para a educação da sociedade e outra voltada para a formação, manutenção ou ampliação da clientela.
Os médicos não recebem em sua formação orientação para lidar com as finanças geradas pelo seu trabalho, não aprendem a planejar e avaliar custos para manter seu consultório ou mesmo administrar seus proventos. Outro fator decisivo foi a compreensão de que os próprios médicos, por medo da banalização e do comportamento predatório de uma minoria, impediam que fossem reconhecidos consentimentos já previstos em lei, mas que poderiam gerar dissabores à medicina como ciência e arte.
Além das discussões preliminares, fizemos uma consulta pública com uma grande participação de médicos opinando sobre quais mudanças desejavam e quais não eram cabíveis. Com esse substrato, debatemos as propostas no grupo Codame do CFM e, em seguida, no Plenário do CFM.
O primeiro desafio foi retirar a diferença entre o consultório médico e os estabelecimentos de assistência médica e hospitalização. Durante
dezenas de anos, foi instituída a existência de duas medicinas: uma que podia agregar auxiliares para execução das prescrições médicas, sob supervisão, cobrando materiais e medicamentos, e outra, na qual era vetada tal autorização, restando ao médico apenas o uso de sua mão de obra.
O segundo desafio foi a autorização para a publicação dos valores da consulta, formas de pagamento e a publicidade de aparelhagem, desde
que utilizado o portfólio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a apresentação, permanecendo a vedação de qualquer comentário superlativo sobre a aparelhagem. O terceiro obstáculo foi separar conceitualmente os veículos de comunicação de massa, nos quais os médicos só poderão se apresentar para promover discussões de caráter educativo, e as redes sociais, que são personalíssimas, pois têm a assinatura do médico ou de suas instituições.
O quarto ponto foi resolver a apresentação do “antes e depois”, que continua como sensacionalismo e autopromoção se apresentado apenas
com esses dois quadros. Para torná-lo virtuoso, são necessárias quatro etapas obrigatória para a divulgação, sempre em caráter educativo e com regras claras e rigorosas. O quinto desafio foi a autorização para cadastramento e divulgação dos certificados de pós-graduação lato senso de capacitação pedagógica, com a obrigatoriedade da aposição da frase NÃO ESPECIALISTA em caixa-alta.
A partir dessas ideias e conceitos, o grupo Codame do CFM trabalhou no texto que levamos ao Plenário do CFM. Depois de três anos e
muitos ajustes, finalmente publicamos o resultado em 13 de setembro de 2023. Esperamos que seja o início de uma nova era na relação do médico com sua profissão e o mercado, além de uma relação de inteira confiança com seus pacientes e a sociedade. Vai caber aos CRMs a incumbência de bem orientar a aplicação das regras previstas na Resolução CFM nº 2.336/2023, para que se engrandeça ainda mais a medicina brasileira.
Durante os mais de três anos em que debatemos esta resolução, contei com o apoio imprescindível dos servidores do CFM e dos CRMs, especialmente das Coordenações Jurídica e de Imprensa e do Departamento de Fiscalização, notadamente as servidoras Maristela Barreto, Eliane Azevedo e Anne Costa.
A todos, meus agradecimentos.
Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti
Coordenador da Codame-CFM
Obs: O novo manual de publicidade médica do CFM está disponível no site da instituição.